quinta-feira, 31 de julho de 2008

As Meninas dos Jardins


Zeca Baleiro é um dos grandes nomes da música pop nacional dos dias de hoje, na minha opinião. E PetShopMundoCão (2002) é, ainda na minha opinião, seu melhor disco. Sendo ainda mais específico: As Meninas dos Jardins, décima faixa desse disco, é a mais interessante delas. E é sobre ela esse post.


Uma das características que mais me faz ser fã do Baleiro é a sua capacidade de misturar sonoridades e referências em suas músicas, talvez por isso eu goste tanto d’As Meninas dos Jardins. A música começa com um piano, depois entram instrumentos de orquestra, beat box e um cavaquinho, tudo de uma vez, antes de entrar a voz de Zeca. Daí já se percebe que as influências são múltiplas. Durante a música aparecem versos de Rua Augusta(Hervé Cordovil)(gravada por Ronnie Cord, Mutantes, Raul, e outros) e Alegria, Alegria(Caetano Veloso).

A letra fala principalmente da desigualdade social, que a música situa na São Paulo contemporânea (referências a bairros e ruas da cidade, como a rua Oscar Freire, por exemplo), mas certamente não se limita a essa cidade ou a esse tempo (isso fica claro nos versos que precedem o título da música na letra: Caravela de Cabral / Morte e vida Severina / As Meninas dos Jardins gostam de rap)

As Meninas dos Jardins gostam de rap. Isso me faz lembrar um verso de Nego Drama, dos Racionais Mcs, em que Mano Brown canta “seu filho quer ser preto, rá, que ironia”. Não é por acaso que me lembra, a música do Baleiro também cita Mano Brown, nos versos “eu vi o mano Mano Brown cantando um rap pra valer / eu vi o mano Mano Brown vestindo Gap na tv”. Acho esse um dos grandes versos da letra, além de demonstrar admiração por Brown, Baleiro ainda comenta sobre a opção do rapper de se vestir com roupas de marca, o que pode gerar grandes discussões; mas esse é um assunto que deve ser olhado melhor nas letras do próprio Brown. Sobre as Meninas dos Jardins, elas gostam de rap mas não só disso, aproveitando-se de seu costume de fazer trocadilhos, Zeca diz que As Meninas dos Jardins gostam de rap / As meninas dos jardins gostam de happy end, aí dá pra ver que elas podem gostar da pose de rapper e tudo mais, mas querem mais o mundo bonitinho dos filmes com final feliz.

O último estrofe da música é mais duro, soa ateu em orações ao vento / preces sem destino. É imagético no verso Sangue no asfalto, e recorre ao trocadilho novamente quando termina dizendo Ninguém é alto o suficiente que não possa rastejar. Essa é a última frase que Zeca canta na música, depois disso entra um coro de mulheres cantando uma cantiga popular adaptada.

"O meu boy morreu
que será de mim?
manda buscar outro correndo
lá no itaim"

(na cantiga original, quem morre é um boi e o outro deve ser buscado no Piauí)


Depois disso, há uma conclusão instrumental da música, novamente beat box, orquestra e acaba só com o piano do começo.


Uma coisa que eu pensei enquanto escrevia isso tudo é que a música também tem cara de narrativa mesmo. O cara acorda de manhã, vai trabalhar de motoboy, desce a rua augusta para fazer algum trabalho nos jardins (a augusta liga o centro aos jardins), passa pela oscar freire quando esta cruza a augusta, no fim acaba sofrendo um acidente e morrendo, aí entra a responsável cantando que precisa de um boy novo. Mas não garanto que seja isso, e nem precisa ser isso pra ser uma excelente letra.


Bem, no texto sobre o Kid17 eu disse que só por Idioteque valia a pena ouvir o disco, é chato me repetir, mas é verdade, por As Meninas Dos Jardins já vale a pena ouvir tudo que puder do Baleiro (e não é pouca coisa). Eu pulei um monte de coisa que queria ter dito aqui, pra não ficar um negócio tão longo e chato, mas espero ter conseguido despertar o interesse de ouvir a música em quem não a conhece.


2 comentários:

u n h a n u a disse...

Também gosto da música.

Unknown disse...

Musica sensacional!